Quem visita a cidade logo percebe uma particularidade muito interessante em seu relevo: a elevação abrupta próxima à costa, em média com 85 metros de diferença entre a parte inferior e a superior, acaba por dividir Salvador em duas partes que ficaram conhecidas como Cidade Baixa e Cidade Alta. Como se pode imaginar, essa configuração natural era um problema para o local, já que o transporte entre os dois níveis era feito através de ladeiras íngremes e longas escadarias, além do uso de guindastes para subir e descer com cargas. A situação se agravou com a expansão dessa que era a capital da colônia portuguesa.

Daí veio o plano de Antônio Lacerda de construir o Elevador Hidráulico da Conceição. Mais que ligar as partes baixa e alta da cidade, isso possibilitaria articular as linhas de bonde urbano, facilitando o transporte para o sul, que estava crescendo. A empresa familiar Antônio de Lacerda & Cia, cujo principal sócio era seu pai, havia comprado os direitos de construção de linhas de transporte na encosta e a firma, que se transformou na Companhia de Transportes Urbanos, levou à frente o projeto.

A construção do primeiro elevador urbano do mundo teve como principais desafios a perfuração de dois túneis na Ladeira da Montanha: um vertical, para abrigar a torre; e outro na horizontal, permitindo o acesso à rua. Embora fosse bastante inovador para a época, o projeto recebeu críticas, principalmente por usar pouco ferro, um dos símbolos dos avanços da engenharia e arquitetura naquele momento. O mecanismo usava uma máquina a vapor e uma grande peça em espiral para impulsionar as cabines, que viajavam por 63 metros de altura.

Após quatro anos de obras, em 1873, foi inaugurado o elevador que ficou popularmente conhecido como parafuso (devido ao espiral) e passou a ser o principal meio de transporte entre a Cidade Alta, onde se encontra o centro histórico, e a Cidade Baixa, região portuária que concentrava as atividades financeiras e comerciais. Na estrutura inicial, cada passageiro precisava ser pesado individualmente e eram feitos cálculos até atingir o limite máximo de segurança para as duas cabines. Obviamente, continuaram a existir as ruas e escadas, mas o Elevador Lacerda, que recebeu o nome atual em 1896, logo se popularizou como a melhor opção para ir direto de um ponto ao outro.

Vários avanços foram feitos ao longo dos anos seguintes para melhorar o sistema, mais notadamente a eletrificação de 1906; a adição de mais dois elevadores e uma nova torre em 1930; uma reforma completa da parte mecânica ao final da década de 1950 e início da seguinte; a revisão da estrutura de concreto no início dos anos 1980; e a reforma geral de todo o maquinário elétrico e eletrônico em 1997. Dessas, a principal foi a reestruturação de 1930, quando se passou de duas cabines para quatro, cada uma delas com capacidade para transportar até 27 passageiros, e a parte visual da arquitetura em estilo art déco. A torre nova é a que se encontra destacada da montanha, ligada à estrutura original por uma longa passarela.

A parte interna tem pisos e paredes de granito e grandes janelas que permitem apreciar a paisagem. A maioria das pessoas que passa pelo local precisa mesmo de ir do ponto mais alto para o mais baixo ou vice-versa, então não há uma grande preocupação turística com o transporte em si. Basicamente você entra e segue o fluxo, paga pelo bilhete, passa pela catraca e entra em um dos elevadores não panorâmicos, então você não enxerga nada da paisagem quando está fazendo a subida ou descida – um grande desperdício, na minha opinião.

Por isso mesmo, recomendo apreciar a arquitetura do Elevador Lacerda quando estiver do lado de fora. Uma opção para os mais empolgados é descer as escadas e ladeiras a pé, apreciando a paisagem por ângulos diversos, já que para baixo todo santo ajuda. Da parte inferior, você consegue ter uma dimensão melhor da altura e pode perceber os desafios enfrentados pelos engenheiros na construção da obra.

Na Cidade Baixa, os passageiros entram e saem do elevador na Praça Visconde de Cairu, onde fica outro dos principais pontos turísticos da cidade, o Mercado Modelo. Também é possível visitar a Basílica Santuário Nossa Senhora da Conceição da Praia e ver muitos prédios históricos. Depois de visitar os pontos turísticos, pode-se subir novamente, dessa vez pelo elevador.

Assim você pode se programar para estar lá em cima mais para o fim do dia, já que se tem uma bela vista da baía e o pôr-do-sol é espetáculo imperdível. Atualmente, cada um dos quatro elevadores transporta 32 passageiros, totalizando 128 pessoas, e a viagem por 72 metros é feita em pouco mais que vinte segundos. Por ali passam cerca de 30 mil moradores e turistas todos os dias. Em cima fica a Praça Tomé de Sousa, que dá acesso aos museus, igrejas, restaurantes e outros atrativos do centro histórico de Salvador, notadamente o Pelourinho. Ao cair a noite, a iluminação noturna confere novas cores à fachada.

Como há ótimos atrativos tanto na parte baixa quanto na alta, todo mundo que visita a cidade vai fazer o trajeto entre os dois níveis usando o elevador que, o bolso agradece, custa apenas alguns centavos. Não é à toa que ele se tornou um dos principais cartões postais de Salvador. Eu já visitei a capital da Bahia várias vezes ao longo dos últimos anos e sempre passo por lá.