Ano: 2020
Direção: Lorcan Finnegan
Elenco: Imogen Poots e Jesse Eisenberg.
Quando um jovem casal formado por uma professora do primário e um arborista resolve procurar por uma moradia própria, eles encontram um novo empreendimento imobiliário ainda totalmente inocupado e enxergam a grande oportunidade de realizar seus sonhos.

A premissa simples esconde uma série de questões que me deixaram em reflexão por um bom tempo: como passamos a desejar consumir seja o que for, para que seguimos padrões pré-estabelecidos e por que nunca ficamos satisfeitos? Nossas vidas podem ser resumidas no ciclo de crescer, trabalhar, conquistar bens materiais, formar uma família, ver os filhos crescerem e morrer?

Esse é um daqueles filmes que permitem interpretações diversas dependendo da sua realidade cultural e social. Como eu assisti no meio do isolamento causado pela pandemia, absorvi algumas questões de maneira bem particular, como convívio forçado e contínuo com as mesmas pessoas por um longo período. Mas o isolamento proposto na trama tem outras razões, estando mais ligado à perda do senso de comunidade e ao sentimento de estar preso, tanto em contratos sociais como um casamento, quanto nos compromissos com bancos e outras instituições financeiras dos quais somos levados a nos tornar reféns.

A inspiração veio da realidade vivida nos últimos anos na Irlanda, co-produtora do filme junto da Dinamarca e da Bélgica. A ilha esmeralda vivia um momento de crescimento econômico que levou à construção de novas casas em série, que acabaram por se tornar bairros fantasmas por volta do ano de 2008, quando a economia do país entrou em queda juntamente com a crise mundial. A história, entretanto, não se passa em nenhum país específico, tanto que eu pensei que se tratava de um filme americano e pode ser aplicada a diversos outros lugares.

O roteiro leva essas questões ao extremo através de elementos de ficção científica, que aparecem na estranheza dos ambientes, nos alimentos plastificados e sem sabor, na infinidade de casas, na lógica e regras distorcidas daquele mundo e outros tantos fatores que não cabe citar para não entrar em spoilers. Esse exagero pode causar distanciamento para muitos espectadores, mas o fato é que tudo que é mostrado pode ser aplicado na nossa realidade.

Afinal de contas, temos medo de viver um cotidiano repetitivo e entediante, mas consumimos basicamente as mesmas coisas, moramos em lugares parecidos e temos as aspirações parecidas às dos nossos amigos e de outras pessoas dentro da nossa bolha social. Estamos tão cercados de artificialidades que falta às coisas e a nós mesmos mais alma. Ao mesmo tempo, temos uma grande dificuldade de sair dessa espiral, talvez pelo medo de tomar decisões que acabem por comprometer nosso futuro particular.

Com características do surrealismo, suspense e drama, esse é um filme difícil de classificar. Também pode não ser tão fácil de assistir, tanto por conter diversos gatilhos para as pessoas que estão sofrendo com a ansiedade dos últimos acontecimentos mundiais quanto por exigir uma postura mais ativa na interpretação para significar os acontecimentos narrados. Para mim, foi uma experiência bastante construtiva.