No meu passeio pelo centro histórico, fiz questão de incluir a ida até essa casa que serve comida indígena tradicional para almoçar e também conhecer um pouco mais da cultura dos nossos povos originários. Diferentemente da perspectiva estritamente comercial muitas vezes adotada por restaurantes de um modo geral, o objetivo ali é nutrir tanto o corpo quanto a alma.
Ambiente ★★★☆☆
O espaço funciona em um dos casarões da Rua Bernardo Ramos, uma das mais antigas e bonitas vias públicas de Manaus. A caminhada é bastante agradável, já que foi mantido o calçamento de pedra original, árvores frondosas garantem sombra para o calor escaldante da cidade e as construções históricas coloridas que criam um belo cenário. Por ali estão alguns atrativos como o Centro Cultural Óscar Ramos, o Casarão da Inovação Cassina e o Museu da Cidade.
A fachada com três janelões decorados com azulejos azuis chama a atenção de quem passa na rua. Mas o interior é bem simples, com os poucos cômodos de pé direito alto acomodando uma loja, um centro de medicina e o restaurante, ao fundo.
Os produtos em exposição na loja são feitos artesanalmente por indígenas, garantindo um modo de sustento para diversas famílias. São cestos, lustres e objetos decorativos feitos de palha; panelas e cuias; colares e pulseiras; entre outros. Os preços são bons e as peças únicas, servindo como uma boa lembrança da viagem.
No Bahserikowi – Centro de Medicina Indígena são realizadas as consultas com o pajé. A sala possui duas cadeiras separadas por uma mesinha de centro e o ambiente fica sempre aberto, integrado ao cotidiano da casa, com funcionários e visitantes passando de um lado para o outro. Após o atendimento, é possível comprar alguns medicamentos ali mesmo.
Por fim, chega-se ao salão do restaurante, onde as poucas mesas ficam em um ambiente extremamente simples. Da decoração minimalista, destacam-se poucos elementos como: os lustres trançados em arumã; os cestinhos com guardanapos; os talheres enrolados em folhas; as cumbucas de coco, gamelas em madeira e cestos de palha onde são servidas as comidas; etc.
Serviço ★★★★★
Todos que trabalham no local são indígenas das etnias Sateré-mawé, do Baixo Amazonas, e Tukano, do Alto Rio Negro. A chef Clarinda Ramos pertence ao primeiro grupo e enxerga a casa como uma forma de colocar em evidência a cultura do seu povo. Como não há intermediários, ali os indígenas, seus costumes e a própria comida falam por si. Achei o atendimento simples e primoroso, feito com muita simpatia e calor humano. Os dias e horários de funcionamento, além de outras informações, podem ser acessados na página oficial.
Preço ★★★☆☆
Esse não é um espaço para alta gastronomia ou releituras contemporâneas. A simplicidade pode passar a ideia de que os valores deveriam ser mais baixos. Mas o fato é que tudo ali é preparado com tempo, usando ingredientes frescos e de boa qualidade. Eu achei o preço justo para a proposta do local.
Comida ★★★★☆
O cardápio do Biatüwi – Casa de Comida Indígena é bem enxuto, retratando uma parte da tradição e alimentação indígena de maneira fiel. São bebidas fermentadas, peixe assados de forma tradicional, caldos apimentados, formigas e farinhas. Embora pareçam exóticos para nós, os pratos fazem parte da alimentação diária desses povos.
Começamos pedindo uma régua de bebidas tradicionais, que vem com aluá (fermentado de abacaxi); caxiri (fermentado de cará roxo e cupuaçu); caldo de cana (fermentado); tarubá (fermentado de mandioca); e sapó (guaraná natural ralado na língua do pirarucu). Somente o último não tem teor alcoólico. Achei os sabores bem diferentes e me agradaram mais os que puxam para o doce.
Para acompanhar mesmo o prato eu pedi um suco de cupuaçu adoçado com melado de cana. Estava bem gostoso, mas também tinha um gosto diferente do que estamos acostumados a sentir com a bebida feita da fruta. Me pareceu mais ácido e com sabor intenso.
Uma das grandes curiosidades de quem vai ao local é experimentar as formigas. Nós pedimos como entrada uma porção mista de formigas sahai e maniwara. São apenas cinco unidades de cada, mas achei bem interessante, inclusive para comparar as texturas e os gostos, que são explicados pela equipe de atendimento.
A refeição mesmo foi uma matrinxã assada na folha de cacau. O peixe é bem servido e acompanha três fatias de beiju, banana assada, farofa de formiga, farinha uarini, molho de pimenta defumada e limão. Embora seja citado no cardápio que é para duas pessoas, dá tranquilamente para comerem três.
Tirando a pele, encontramos um peixe muito suculento. A chef chegou a perguntar se queríamos ele mais assado e seco, mas comemos desse jeito mesmo. Uma curiosidade da cozinha: os peixes são preparados no moquém, uma grelha de origem indígena feita madeira. Em três andares são dispostos os alimentos enrolados em folha de cacau ou cupuaçu para conservação, cocção e defumação.
Depois de um prato tão bem servido, não tinha nem como pensar em sobremesa. Mas trouxeram como cortesia um tipo de geleia de fruta que também estava gostosa – nem sei do que era, só comi.
Resumo ★★★★☆
O Biatüwi – Casa de Comida Indígena é mais que um restaurante. Além de permitir conhecer a comida regional, também proporciona o contato direto com pessoas da comunidade e sua cultura. Complementam a visita a loja e o centro de medicina tradicional.