Eu confesso que fiquei um pouco perdido quando comecei a pesquisar os passeios pelos glaciares em El Calafate devido à grande variedade de opções. Acabei optando por me concentrar em dois deles. A excursão ao Glaciar Perito Moreno me pareceu obrigatória para todos que visitam a região, já que tem o acesso mais fácil e mirantes que proporcionam uma visualização perfeita. Eu ainda inclui nesse dia o minitrekking no gelo, pois queria ter a experiência de caminhar sobre o glaciar.
O segundo foi o Todo Glaciares, com um dia inteiro de navegação pelos braços ao norte do Lago Argentino. Embora seja vendido por diversas agências, o passeio é realizado somente pela empresa Solo Patagonia e os preços são praticamente os mesmos independente de por onde você compra. Eu recomendo fazer a reserva com antecedência, principalmente se a viagem acontecer durante a alta temporada dos meses de verão.

Você deve definir como vai chegar até o Puerto Punta Bandera, que fica a uns 50 km do centro do povoado, um percurso que dura cerca de 40 minutos. A opção de alugar um carro pode ser interessante porque dá mais liberdade para explorar a região, inclusive fazendo alguns passeios por conta própria, e pode representar uma boa economia, já que é cobrado um valor à parte para incluir o transfer da hospedagem.

Se estiver em um apartamento ou casa alugados, será necessário se deslocar até pontos de encontro pré-estabelecidos. Como eu estava no Hotel Kosten Aike, me buscaram na porta com um ônibus de passeio. Chegando ao porto, todos desembarcaram e se dirigiram aos guichês para comprar o ingresso, já que se trata de uma área de conversação ambiental. O pagamento deve ser feito em dinheiro e é importante guardar o a entrada, pois há desconto de 50% para quem vai fazer outro passeio no Parque Nacional Los Glaciares.

O Catamarã Nueva León tem capacidade para 208 passageiros e os assentos são escolhidos livremente por ordem de entrada, sendo mantidos durante toda a viagem. Por isso, é importante agilizar o embarque se você quiser ficar perto das janelas e ter uma visão melhor durante o trajeto. Não é imprescindível, porque há muitos momentos em que você pode se levantar e ir para a parte de fora da embarcação, tanto durante a navegação quanto nos pontos de parada junto aos atrativos.

Falando nisso, mesmo nos meses mais quentes, é preciso levar roupas de frio em camadas, para colocar e tirar de acordo com a necessidade, incluindo acessórios como cachecol, touca e luvas. Também é importante ter um casaco à prova d’água e corta-vento. Lembrando que o clima perto dos glaciares pode ser bem diferente daquele na cidade de El Calafate. Isso porque os atrativos ficam a uma distância de uns 80 km em linha reta partindo do centro da cidade.

A navegação é feita pelo Lago Argentino, um dos maiores do país, com superfície de 1415 km2 e profundidade média de 150 m, alcançando centenas de metros nos pontos mais profundos. Passando pela Boca del Diablo, acessamos o braço norte do lago. Ali, as paisagens impressionam com as águas verdes, as montanhas nevadas e a passagem de blocos de gelo.

Durante a viagem, os guias falam em um microfone em inglês e espanhol, mas também é possível acompanhar diversas informações nos painéis distribuídos pela embarcação. Achei interessante para entender melhor a dimensão do parque e dos glaciares, além de características gerais do que era visto ao lado de fora.

Ali tem uma cafeteria, onde é possível comprar lanches e bebidas. Mas quem quiser economizar pode levar seus próprios alimentos. Eu tinha frutas, barrinhas de cereal, chocolate, castanhas e bastante água. Eu já planejava comprar o almoço, para não ficar o dia inteiro sem comer uma refeição completa, mas o passeio dura cerca de dez horas e é sempre bom ter algo para enganar a fome. Obviamente, o barco também conta com banheiros.

O Hielo Patagónico Sur (HPS) é um dos maiores acúmulos de gelo em todo o mundo, com 360 km de extensão de norte a sul. São formados 48 glaciares principais, que descem como rios lentos pelas montanhas das Cordilheiras dos Andes em direção ao Oceano Pacífico pelo lado do Chile e formando grandes lagos ao leste, na Argentina.

Ambos os países criaram áreas de proteção ambiental nessa região, já que os glaciares tem diminuído ao longo dos anos. Do lado argentino, o Parque Nacional Los Glaciares surgiu em 1937 e, além das geleiras, também tem como objetivo preservar os bosques, estepes, lagos e montanhas da região. Com 726.927 hectares, é o maior parque do país.

Ao entrar em um dos canais do lago, passamos pelo Glaciar Seco, assim chamado por não chegar a tocar na água; o Glaciar Heim Sur, que não parece tanto com um rio descendo a montanha; e o Glaciar Peineta, que pode até passar desapercebido porque se junta ao seguinte, que é bem maior.

O Glaciar Spegazzini é o principal ponto visitado nessa área e passamos ali boa parte do tempo. Ao contrário de outros glaciares, ele não tem apresentado um grande retrocesso, mantendo-se estável nas medições feitas entre 1964 e 2010. Seu nome é uma homenagem a Carlo Luigi Spegazzini, botânico e micologista ítalo-argentino que descreveu, ao longo de sua carreira, quase 3000 novas espécies de plantas e fungos. Após terminar seus estudos na Itália, se estabeleceu na Argentina, de onde partiu para diversas expedições.

O paredão de gelo tem cerca de 1,3 km de largura e a parte que fica acima do nível da água alcança dezenas de metros de altura. À medida que chegamos mais perto, dá para ter uma dimensão da grandiosidade e da beleza de suas formas e tons azuis, formados pela compactação da neve formada no alto da cordilheira.

Esse é um dos momentos em que todos os turistas vão para a parte externa para tirar fotos. Embora seja bastante gente, achei bem tranquilo porque eles vão girando a embarcação, então todos ficam com uma posição boa em algum momento. Também trabalham ali alguns fotógrafos profissionais. Eu acho o serviço caro para o que é oferecido, sendo possível se virar bem por conta própria. Mas, caso tenha interesse, converse com antecedência para entender bem o que está incluso em cada pacote.

Depois das fotos, atracamos em um porto flutuante que dá acesso à Base Spegazzini, que tem uso exclusivo para os passeios realizados pela empresa que faz o passeio Todo Glaciares. Ali nos informam quanto tempo vamos ficar ancorados, o que há para fazer nessa área e algumas outras informações relevantes.

Na curta caminhada há alguns atrativos, incluindo um mirante onde, além da vista, também temos uma escultura do explorador argentino Francisco Pascasio Moreno. Ele é mais conhecido como Perito Moreno devido a seu trabalho de pesquisa na região patagônica que contribuiu para a determinação das fronteiras argentina e chilena, buscou a valorização e proteção dos povos originários e trouxe descobertas diversas sobre os ecossistemas locais e sua história.

Aliás, a guia também deu algumas explicações para quem estava interessado em saber um pouco mais sobre a fauna e flora locais. Entre outras coisas, deu para entender porque víamos tantas árvores caídas, pois o solo nessa área é raso e as raízes ficam superficiais. Além disso, o forte vento característico da região contribuem para a queda de galhos, sendo importante se manter nas trilhas.

Outras pessoas preferiram seguir direto para o Refúgio Spegazzini, que fica a menos de 200 metros do porto. Ali há banheiros e uma loja de conveniência para quem quiser comprar lanches e bebidas. Como os preços são mais elevados que os encontrados na cidade, muitos preferem levar seus próprios alimentos, que podem ser aquecidos nos microondas do saguão.

Outra opção é a refeição do restaurante, que deve ser adquirida antecipadamente na cafeteria do barco. Eu não sabia se seria gostosa, mas resolvi arriscar porque o passeio dura o dia inteiro e eu não queria ficar limitado aos lanches que tinha levado. Escolhi o goulash de guanaco, que é uma carne de panela de um animal típico da região, acompanhado de purê de batatas. Como de costume, também serviram um pãozinho de entrada. Fiquei bem satisfeito.

Quem viaja na Excursão VIP tem uma área reservada e menu especial no refúgio, com entrada, prato principal e sobremesa assinados por um chef. O passeio é feito no mesmo barco, mas viajando na parte superior, onde fica menos gente. Não acho imprescindível, mas seria uma experiência diferenciada. Quem tiver interesse, deve comprar com antecedência pois as vagas são limitadas. Eu deixei para resolver isso depois de chegar em El Calafate e já não havia disponibilidade.

Na hora marcada, pegamos novamente o catamarã e os tripulantes cataram um gelo que estava flutuando por ali e foi passado de mão em mão para tirar fotos. Dali partimos para visitar o último glaciar, mas é importante notar que a ordem do passeio pode mudar de acordo com o horário de partida, a programação do dia ou as condições climáticas.

O Glaciar Upsala foi descoberto em 1901 por H. Pritchard, que o chamou de Glaciar de los Gigantes devido às suas proporções impressionantes, sendo o terceiro maior do continente sul americano. Eu nem consegui ver ele direito porque uma nuvem baixa estava atrapalhando bastante a visibilidade.

Por terminar em águas muito profundas, sua taxa de desprendimentos é bastante alta, sendo comum ver por ali enormes témpanos ou, como são chamados mais comumente pelos brasileiros, icebergs. Embora já pareçam grandiosos, o que vemos é apenas uns 10% de seu volume total, já que a maior parte fica sob a água.

Depois de mais um bocado de fotos, pegamos o caminho de volta em direção ao Puerto Punta Bandeira, de onde partimos no começo do dia. Ainda deu para aproveitar a beleza do pôr-do-sol nos muitos quilômetros percorridos pelo Lago Argentino. Chegando ao porto, pegamos o ônibus para fazer o transfer até a hospedagem ou descer no centro da cidade e emendar com um jantar.
