Quando eu programei minha viagem para El Calafate, a ideia era aproveitar suas belas paisagens e conhecer os famosos glaciares, que funcionam como rios congelados que descem bem vagarosamente as montanhas da Cordilheira dos Andes, alimentando grandes lagos. Mas acabei fazendo passeios também focados na história local, o que enriqueceu bastante a experiência.
Antes da chegada dos colonizadores, a área era chamada de Kehek Aike pelo povo aonikenk. A expressão que pode ser traduzida como o “paradeiro que é depósito de artefatos e bens humanos”. De fato, ali foram encontrados diversos instrumentos, além de pinturas rupestres com milhares de anos. Esses indígenas eram nômades, caçadores e coletores que percorriam a região para caçar os guanacos, um animal da mesma família dos camelos, lhamas e alpacas.
Os grupos eram formados por até cinquenta pessoas e viviam em abrigos provisórios de cavernas e encostas. Eu tive mais contato com essa parte da história em uma visita à Punta Walichu, que fica a cerca de 15 km do centro da cidade. Ali se encontra um sítio arqueológico à beira do Lago Argentino com pinturas importantes para os estudos sobre o modo de vida desses povos.
A ocupação permanente, localizada no sul da Argentina, bem próxima à fronteira com o Chile, só surgiu nas primeiras décadas do século XX. Fundada em 1927, a comunidade tinha como objetivo principal garantir o domínio territorial. Para atrair os moradores ao local inóspito e de clima extremo, o governo argentino incentivou a abertura de estâncias produtoras de lã, produto cuja demanda aumentou substancialmente com a revolução industrial.
El Calafate era o ponto de encontro dos trabalhadores das fazendas, moradores da região e visitantes, pois contava com um armazém geral, posto de serviços e hospedagem. A cidade recebeu o nome de um arbusto que nasce na região e produz uma frutinha usada para fazer doces, licores, geleias e outros produtos diversos. Dizem que quem come o calafate tem mais chance de voltar a visitar o local.
Em 1937, foi criada uma área de preservação ambiental com foco nos campos de gelo da Patagônia Argentina. É o mais extenso sistema de áreas protegidas do país, com uma área de quase 727 mil hectares que conta com montanhas, glaciares, florestas, estepes e lagos. A reserva recebeu a denominação de Parque Nacional Los Glaciares anos depois.
Em 1943, foi dado início às obras da construção da Intendência do Parque Nacional Los Glaciares no povoado. A instituição, responsável pela administração da reserva, também garantia investimentos na infra-estrutura local, como o fornecimento de eletricidade, abertura de estradas, construção de pontes, gerenciamento do hotel, inauguração de um cinema e outros avanços diversos.
A partir da década de 1970, a presença de viajantes se tornou mais frequente, principalmente para visitar o Glaciar Perito Moreno. Hoje é possível chegar lá por uma estrada totalmente asfaltada e bem sinalizada. Além disso, o local conta com boa estrutura de passarelas com mirantes, portos para passeios de barco, estacionamentos, restaurantes, lojas e banheiros. Eu fiz até mesmo uma caminhada sobre o gelo, experiência única.
Outros pontos só podem ser alcançados com um passeio de barco, como os impressionantes Glaciar Spegazzini e Glaciar Upsala, com paredões largos e altos. Os pedaços grandes que se desprendem formam icebergs que ficam flutuando nas águas do lago, mas somente 10% de seu volume pode ser visto, já que a maior parte fica submersa.
Com grande potencial turístico, a cidade cresceu bastante e hoje conta com centenas de opções de hospedagem entre casas, apartamentos, hotéis, albergues e outros. Eu escolhi ficar no Hotel Kosten Aike, que possui uma estrutura bastante confortável e fica perto da avenida principal, onde se concentram as agências de turismo, lojas e opções gastronômicas.
Chegar lá também é bem fácil, já que o aeroporto internacional foi inaugurado no ano de 2000 com boa estrutura e fica a apenas 20 km de distância do centro. Com isso, a cidade também serve como ponto de entrada para outras localidades próximas, como El Chaltén, muito procurada por suas trilhas, e Torres del Paine, já no país vizinho.
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